Corpo - Contato Improvisação - Artes do corpo - Videodança.

sexta-feira, junho 13, 2008

Videodança - Espaço Café cultural

Pesquisa: Luciana Ponso


Pesquisar sobre o tema “Videodança” é um desafio instigante. Esta recente linguagem não traz conceitos fechados ou definições encerradas sobre o tema. Porém em determinado momento da contemporaneidade as duas linguagens, vídeo e dança, cruzaram-se de tal forma que hoje existem mais de 30 mostras internacionais e algumas nacionais que exibem e discutem essa nova linguagem.

A proposta dessa pesquisa busca relacionar alguns pontos que podem auxiliar na reflexão e na discussão da importância que a “Videodança” tem no contexto atual da dança contemporânea e das artes visuais e eletrônicas.

Assim, a pesquisa divide-se em partes:
1) Interface entre vídeo, cinema e dança
2) Videodança: possíveis definições
3) Videodança: tendências e possibilidades
4) Mostras nacionais e internacionais
5) Bibliografia

Com bibliografia ainda restrita sobre Videodança, buscou-se para realizar a pesquisa, informações nos depoimentos de realizadores, coreógrafos e videomakers. Este material será utilizado para a realização de um documentário a ser concluido em parceria com a Cavídeo, sob orientação de Rodrigo Maia (co-pesquisador da presente pesquisa), Caví Borges e Luciana Ponso.

1)Interface entre vídeo e dança

É preciso pensar como as novas tecnologias estão transformando a nossa experiência de espaço e, assim, o que é o movimento. Desde o telégrafo, foi possível dissociar a transmissão de informações de deslocamento no espaço dos homens. Na sequência, o rádio, a televisão, o computador, a internet e a realidade virtual, cada um a seu modo alteram a distinção entre o próximo e o longínquo e, deste modo, a separação entre o real e o imaginário. Chegamos assim ao nosso mundo, onde o simultâneo não se define mais pela extensão perceptiva e motora do corpo; depende, sim, da velocidade e conexão na transmissão de informações. A novidade propiciada pelas novas tecnologias é a dissociação entre contiguidade e simultaneidade, a condição da interação. Não é preciso que haja proximidade espacial para os homens poderem interagir.
(Paulo Vaz e Maurício Lissovsky)

O ponto em comum entre vídeo e dança é o fato de que ambos tratam de imagem e movimento, porém a abordagem de corpo e movimento se dá de maneiras distintas. A dança filmada e a dança ao vivo tem diferenças fundamentais. Quando há ausência do corpo ao vivo o resultado no vídeo é bidimensional provocando uma menor profundidade no campo de visão do que na dança ao vivo. O efeito de distância, se a figura está longe ou perto é sobreposto ao efeito de tamanho, se a figura está pequena ou grande em relação a tela. No vídeo perde-se a imediação física e cinestésica do corpo. A gravidade, o peso, o esforço, o impulso do movimento fazem menor sentido e a trilha sonora recupera uma presença mais física: utilizam-se por exemplo sons de respiração, sons do corpo se movendo ou se arrastando pelo chão. No cinema narrativo a trilha sonora é usada como suporte emocional da narrativa ou como pano de fundo da cena enquanto que em um video de dança a trilha sonora ocupa uma função estrutural.

Quando há presença da câmera, podemos notar que o tamanho da tela define o campo de visão selecionando necessariamente o que se vê. Enquanto que na apresentação ao vivo, o olho do espectador pode mover-se livremente, no filme o olhar é determinado pela câmera. Mas se por um lado essa câmera traz limites ela também abre outras possibilidades como por exemplo a edição. O mesmo movimento pode ser exibido de várias maneiras sem a preocupação com a lógica física ou temporal. O vídeo conta com numerosos efeitos como: imagens superpostas, câmera lenta, close, inversão de imagens, animação e cria assim possibilidades para gerar a sensação tridimensional numa tela bidimensional.

2)Videodança: possíveis conceitos

Videodança é uma linguagem que associa corpo, espaço e movimento com a linguagem do vídeo. Cada um desses elementos desencadeiam inúmeras possibilidades próprias e de relações entre si.

Definir Videodança na sua essência parece ser tarefa difícil e desnecessária em tempos de experimentações, redescobertas e transformações entre as artes. Entretanto, constata-se a Videodança como linguagem apesar de suas fronteiras estarem abertas. Sendo uma linguagem, as características mais essenciais podem ser percebidas sem que se encerre ou segmente as suas potencialidades.

Podemos pensar em Videodança como uma produção em que há o cruzamento de duas linguagens: vídeo e dança. O pensamento do coreógrafo e do videomaker estão agregados de tal maneira que não podem ser dissociados. O trabalho se bifurca nas especificidades da dança e do vídeo mas volta a um ponto comum. O corpo se relaciona com o espaço do vídeo e o vídeo exerce alguma função que deve ser essencial. O resultado é um vídeo e deve se resolver por si só.

Já o registro de dança é eficaz quando torna possível que a coreografia seja vista fora do âmbito teatral ou onde quer que ela tenha sido realizada. Aqui, os recursos de edição e de efeitos podem ser utilizados e até mesmo valorizar a coreografia, mas não há relação direta na criação coreográfica. O vídeo tem aplicações infinitas, mas a coreografia registrada continua sendo igual sem interferência nenhuma do videomaker na música, no ritmo ou em qualquer encadeamento coreográfico. No Videodança, o videomaker é figura fundamental e em mostras no exterior ou mesmo no Brasil há oficinas específicas para artistas de vídeo.

Questiona-se o que fez essas duas linguagens aproximarem-se. Pode-se pensar na abstração como sendo um elo de ligação entre vídeo e dança. Constituída de narrativa aberta, a dança quando se aproxima do vídeo que não é registro aproxima-se da experimentação. As escolhas que os videastas fazem quando vão trabalhar com dança passam pela experimentação. A abstração da dança possibilita inúmeras formas de inserir o vídeo. Se a dança não tivesse a narrativa aberta que tem, se tivesse cenas fechadas, talvez deveria-se usar a linguagem cinematográfica onde as possibilidades são mais restritas.

Junto a dificuldade de definir o que é dança contemporânea, está a dificuldade de incluir no trinômio corpo, espaço e movimento, que a princípio definem Videodança, que corpo, que espaço, que movimentos são esses. Para citar um exemplo, há videodanças onde a presença do corpo humano não é o essencial e a coreografia fica a cargo de outros elementos como pássaros, árvores, carros... A própria questão da presença do corpo pode ser explicada pela sua ausência. O corpo pode não estar fisicamente no vídeo mas pode ser sobre isso que o coreógrafo e o videasta estejam querendo falar. Em Ação Cultural discute-se o papel do artista plástico por exemplo, como não sendo mais o central. Junto a ele vem o papel do curador , do museu, da galeria, do público. Transportando para a dança, o corpo do bailarino parece não ser essencial para a questão do movimento.

Talvez a dificuldade de definir o que é Videodança se resolve quando o próprio artista se propõe a mostrar a obra em um determinado contexto. O vídeo tem a possibilidade de mostrar a dança onde as vezes não é possível ver: nos objetos, nos movimentos naturais, nos fluxos das coisas...

3)Videodança: tendências e potencialidades

Se antes faziam-se estudos em coreologia para registrar as coreografias, o vídeo vem revolucionar as formas de registro. Os acervos em vídeo enriquecem a história da dança e propiciam eternizar uma obra coreográfica dentro das possibilidades bidimensionais que o próprio vídeo oferece.

A tendência da contemporaneidade é brincar com as fronteiras que as ferramentas da arte oferecem. O Videodança é resultado da junção experimental de duas linguagens e o seu potencial é extenso. Para auxiliar o entendimento das tendências e possibilidades que essa ainda jovem linguagem oferece, citamos o trabalho desenvolvido pela AMCD- Andrea Maciel Cia de Dança que vem utilizando as artes visuais e eletrônicas em seus espetáculos e produções de vídeo.

O primeiro contato com vídeo se deu no espetáculo “Eletricidade” em 2002, quando este vídeo funcionava então como paisagem, como fonte de luz, como movimento virtual. E então houve a necessidade de sobrepôr as camadas do real com o virtual.

O trabalho em conjunto da coreógrafa Andrea Maciel, do videasta Paulo Mendel e do artista plástico Giorgio Ronna tornou-se indissociável desde o processo criativo inicial até as intervenções em cena. Estabeleceu-se uma linguagem intensa no conceito e na estética do trabalho. Este trabalho em conjunto se bifurca nas especificidades de cada um mas volta a se encontrar em determinado ponto.

Em “Corpo Imaterial” o movimento de filmar estava revelado na cena. Havia um duo da bailarina com o videasta e depois do evento ao vivo foi feito um vídeo com resultado bidimensional. Então havia o movimento do câmera como movimento coreográfico e o encadeamento das partes na edição resultou em um Videodança. A cena da performance usou as duas linguagens, o vídeo foi complemento para a dança e vice versa. A informação visual se materializou enquanto imagem nesses dois planos e são interdependentes a partir do momento em que foram reunidos. No caso, o vídeo resultante se sustenta como vídeo, ele não se prende a situação do plano real.

O mesmo ocorre com “Por onde os olhos não passam” que existe em versão espetáculo e versão Vídeodança. Realizado na Bahia em 2003, durante o processo criativo para o espetáculo havia paralelamente, a concepção para vídeo. O videasta estava presente durante todo o processo de ensaios e de decisões do que seria feito. Tudo que ocorreu no dia da filmagem já havia sido conversado antes. A criação, a idéia, tudo é concebido em conjunto: as imagens que serão trabalhadas e os movimentos que tem a ver com essas imagens ou que podem se associar. Muitas vezes o videasta dá idéias de dinâmicas ou movimentações e muitas vezes a coreógrafa fala de imagens. Então o editor coreografa editando e a coreógrafa edita dançando.

Em 2004 criou-se “Noisescape” (espetáculo), onde um novo recurso é inserido: a animação. Quando se trabalha dança convencionalmente trabalha-se tridimensionalmente e esse efeito pode ser encontrado na tela bidimensioal com o uso da animação. Esta obra trata do uso do vídeo no espetáculo ao vivo, mas a interação com a projeção no plano real é tão intensa que a sensação é a de que todo o conjunto está em plano virtual.

Talvez o diferencial do trabalho realizado pela AMCD, seja o fato de que não há resistência entre a coreógrafa , o videasta e o artista plástico. Não há resistência da coreógrafa quando o videasta não completa o seu movimento no vídeo, pois talvez não deva ser completado. Por outro lado a edição deve saciar a coreógrafa de alguma forma, do contrário, o trabalho resultaria insatisfatório. Há um conhecimento significativo e mútuo na amplitude dos movimentos de câmera e corporais um do outro.

A companhia procura não encerrar questões, pois está também experimentando coisas novas. Entretanto o envolvimento com a tecnologia depende de estruturas nem sempre alcançáveis. As idéias nem sempre são viáveis. Por exemplo, Philipe Decouflé realiza vídeos de alta sofisticação e trabalha com aparelhagem cinematográfica. Ele pode criar ilusões que dependem dessa tecnologia avançada. No Brasil temos uma limitação finaceira que determina uma limitação experimental.
Mesmo com a restrição estrutural, a AMCD vem firmando uma parceria com a experimentação do vídeo e da dança e essa linguagem parece ser indissociável, felizmente, ao objetivo da companhia.

4)Mostras e festivais nacionais e internacionais

O projeto Rumos Itaú Cultural Dança (SP) vem desde 2001 abrindo espaço para a linguagem de Videodança contribuindo para a especialização, estimulando a produção e difundindo obras brasileiras no próprio país e no exterior.

Na edição de 2004, o Itaú Cultural recebeu 66 vídeos dos mais diversos estados e contemplou 12 trabalhos que receberam uma oficina com a filmmaker Laura Taler. Outros 15 trabalhos foram selecionados para a mostra aberta.

No edital do evento as normas para inscrição deixam claro que não serão aceitos registros de dança e sim obras coreográficas criadas especificamente para a câmera. Afirma ainda que os projetos deverão ser concebidos cooperativamente entre um coreógrafo e um videasta. O Dança Brasil (RJ) conta com uma mostra de vídeo sob curadoria de Lionel Brum e Paulo Caldas. Na edição de 2004 criou o “Painel Brasil” quando se constatou a necessidade de abrir espaço para a produção local. Mais de 40 vídeos foram enviados para a mostra, dos quais 15 foram selecionados. A mostra contou também com a palestra do jornalista londrino Sanjoy Roy, especialista em dança contemporânea e firmou parceria com o British Council e com o centro de referência da dança contemporânea britânica e mundial, o The Place e seu departamento dedicado a filmes de dança, o Videoworks.

O Dança em Foco (RJ) também com curadoria de Lionel Brum e Paulo Caldas tem o objetivo de aproximar o vídeo e a dança, abordando os elementos do vídeo no palco e do Videodança. Na edição de 2004 (segunda edição) conta com oficinas, mostras e palestras ministradas por Tamara Cubas e Willy Donner.

O Correios em Movimento com curadoria de Giselle Tápias, conta com uma programação permanente de vídeo desde 1999. E na edição de 2004 dedica uma mostra específica de Videodança.

http://www.espacocafecultural.com.br/CafeCultural.nsf/paginas/CafeCultural&CDPD-RJ&Pesquisa&CDPD_pequisa_MarcoAbril

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